Quando se encontra com o movimento e os trejeitos de capturar a natureza do ser em Emmanuel Lévinas, descobre-se não só a importância que ele dá à ética, como também à Palavra de Deus, sobretudo em tempos que equivocadamente, a meu ver, exclui-se a relação da Filosofia com a Revelação divina. Acredito que essa aproximação traz uma riqueza formidável para o alargamento de nossa compreensão do mundo e da Natureza do ser.

Para Lévinas, deve-se por em questão a “essencial natureza”[1]. O que Lévinas quer fazer é dar uma reviravolta no pensamento de sua época. Conheceu Heidegger, Sartre. Fora aluno de Husserl e contemporâneo de duas grandes guerras mundiais do Século passado. Não bastasse isso, Lévinas propõe superar seus contemporâneos, de tal modo que rompe com o subjetivismo individualista e psicológico de seus colegas de discussão filosófica. Dá à fenomenologia todo um estranhamento que lhe é própria.

Sua visão parte do outro homem. Pra começar, Lévinas desconstrói uma metafísica inteiramente emotiva e caminha em direção à liberdade do outro, do rosto do outro, descobrindo aí o próprio âmago do fenômeno, um excedente de significação que chama de “glória”[2]. A superação de Lévinas tem uma saída que passa pela “glória”, a qual lhe suplica, reclama, convoca responsabilidade. Uma súplica, uma reclamação e uma convocação bastante coerente à sua visão do rosto de outrem. Daí, uma pergunta se faz oportuna: “Não se deveria chamar palavra de Deus esta súplica ou esta interpelação ou esta convocação à responsabilidade?”[3].

Mas Lévinas recorre à palavra glória nesta obra, é bom que se fique claro, para falar do rosto que é, segundo ele, o excesso de significado pelo outro. Chegar ao extremo pelo outro. “A orientação da consciência sobre o ser na sua perseverança ontológica ou no seu ser-para-a-morte, em que a consciência está segura de ir ao extremo – tudo isto é interrompido frente ao rosto do outro homem. É, talvez, este além do ser e da morte que significa a palavra glória, à qual recorri ao falar do rosto”[4].

Lévinas parece entender “glória” quase como um grito da natureza. Para lembrar Spinoza, o próprio Lévinas afirma: “O humano por detrás da perseverança no ser”. Em outras palavras é ver o humano por trás do “conatus” de Spinoza, como se a natureza ficasse nua diante de nossos olhos.

Vejamos, assim, o que Lévinas fala do natural para endossarmos esta ideia: “No natural do ser-ao-qual-importa-seu-próprio-ser, em relação ao qual todas as coisas, como o que está ao alcance da mão, como utensílio – e até o outro homem – parecem tomar sentido, a essencial natureza põe-se em questão. Reviravolta a partir do rosto de outrem em que, no seio mesmo do fenômeno em sua luz, significa um excedente de significância que se poderia designar como glória que me interpela e me ordena”[5].

Todavia, se a crise de seu tempo encontrava-se numa autonomia do eu que nega toda alteridade pelo assassinato ou pelo pensamento englobante e totalizante geradores de guerras e conflitos entre os povos, é preciso então erradicar a deposição pelo eu de sua soberania de eu: “Na deposição pelo eu de sua soberania de eu, sob sua modalidade de eu detestável, significa a ética, mas também, provavelmente, a própria espiritualidade da alma e, certamente, a questão do sentido do ser, isto é, seu apelo à justificação”[6].

Portanto, a deposição do eu(mesmo) como eu(outro) ou do velho eu a um novo eu também se inscreve assim: “A maravilha do eu reivindicado por Deus no rosto do próximo – a maravilha do eu desembaraçado de si e temente a Deus – é assim como a suspensão do eterno e irreversível retorno do idêntico a si mesmo”[7].

Prof. Jackislandy Meira de Medeiros Silva.

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[1] LÉVINAS, Emmanuel. Entre Nós. Ensaios sobre a alteridade. Rio de Janeiro, Petrópolis: Ed. Vozes. 2004. pág. 196.

[2] Ibidem.

[3] Ibidem.

[4] Ibidem.

[5] Ibidem, pág. 175.

[6] Ibidem.

[7] Ibidem, pág. 176.


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