O que fazer para desconversar algo que pode nos afetar emocionalmente? O que respondemos quando ouvimos algumas perguntas cujas respostas poderão constranger as pessoas ou até mesmo envergonhá-las? Eis algumas questões delicadas para nossa reflexão. Não seria melhor dissimular algumas verdades para o bem da convivência social, para a saúde emocional e para a ética!?

A dissimulação nos círculos de conversas nem sempre é o mais desejável, visto que ficamos com a resposta engasgada, temendo às vezes incomodar a paz do outro com uma verdade mal colocada. Quando o assunto é irritante, a resposta vem de imediato com palavras as mais violentas possíveis. Palavras estas carregadas de raiva podem ferir sem piedade nossos oponentes, bem como expressões cheias de verdades que os constrange, que os envergonha, de modo que a prudência é o melhor caminho nessas horas. Manter a serenidade; escolher bem as palavras; pesar cuidadosamente cada termo pode ser a saída mais sábia que merecidamente não trarão piores consequências para os espíritos comoventes e sensíveis.

É óbvio que não há só espíritos dessa natureza, no entanto, para estes, requer de quando em quando não economizar as dissimulações. Vejo aqui a dissimulação não como uma fuga do assunto em vigor, tampouco uma simples saída de retirada, porém uma estratégia sábia e interessante para amenizar os ânimos exaltados acerca dos problemas delicados do dia a dia.

Preservar as amizades e a saudável convivência social por meio de dissimulações parece-me também, razoavelmente, uma atitude inteligente, na medida em que preservamos nossa integridade e simultaneamente a do outro, do ponto de vista ético, emocional e pessoal.

Gostaria de me fazer entender um pouco mais aqui, se possível, pensando o termo “dissimulação” como indiferença, apatia, imparcialidade e autodomínio em relação a tudo que possa nos afetar negativa e injustamente.

Há um texto do filósofo alemão Heidegger, um dos baluartes da fenomenologia, que escreve sobre a dissimulação a partir da ontologia da verdade. A dissimulação teria uma relação com o “deixar-ser desvelador”. Uma espécie de não-verdade original ou, como segue Heidegger ao dizer: O velamento do ente em sua totalidade”. De fato, como alude este filósofo, a dissimulação dá brechas ao “mistério” que é a dissimulação do que está velado. (Cf. HEIDEGGER. Sobre a Essência da Verdade. Col. Os Pensadores. São Paulo. Nova Cultural, 1991. p. 131).

Todavia, parece-me que aproveito a ideia de dissimulação em Heidegger para forçar um pouco a aproximação psicológica e ética que muitas vezes emana de nós, seja em discussões de ordem familiar, religiosa ou política que de algum modo mexem com nossas emoções provocando as mais diversas reações de raiva, ódio, alteração da voz, alteração do humor, etc...

Certamente, esta não é a ideia exata de Heidegger ao falar da dissimulação, mas não nos custa ouvir o que ele nos diz um pouco mais sobre o assunto. Pois, enquanto não-verdade que domina o homem e o ser-aí, o filósofo afirma a dissimulação: “Nada menos que a dissimulação do ente como tal, velado em sua totalidade, isto é, o mistério. Não se trata absolutamente de um mistério particular referente a isto ou àquilo, mas deste fato único que o mistério – a dissimulação do que está velado – como tal domina o ser-aí do homem”(Ibidem).

Portanto, não há mal algum para os que hão de dissimular sempre que necessário ao bom senso, haja vista que “até o tolo, quando se cala, será reputado por sábio; e o que cerrar os seus lábios, por sábio”(Pv. 17.28).


Prof. Jackislandy Meira de Medeiros Silva

Licenciado em Filosofia pela UERN e

Especialista em Metafísica pela UFRN


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